quinta-feira, 5 de março de 2020

Maya, A Ilusão do Eu Inferior

Samadhi é uma palavra antiga do sânscrito, que alguns chamam de devanagari – a língua dos deuses, para a qual não possui nenhum equivalente moderno. Por isso mesmo é um fundamental desafio falar sobre Samadhi.
Samadhi leva a algo impossível de ser transmitido no nível da mente.
Então, este texto é simplesmente a manifestação exterior mental de uma jornada que só pode ser feita interiormente. A intenção não é ensinar sobre o Samadhi ou fornecer informações para alimentar sua mente, mas sim, inspirar você a descobrir diretamente sua real natureza.
Samadhi é relevante agora mais do que nunca.
Estamos em uma época na história em que esquecemos não só o Samadhi, mas temos nos esquecido do que nós esquecemos.
Este esquecimento é Maya, a ilusão do Ser.

A ILUSÃO DO SER
Como humanos a maioria de nós vive imerso em nossas vidas cotidianas, com pouca ideia de quem somos, por quê estamos aqui ou para onde estamos indo.
A maioria de nós nunca realizou o verdadeiro Ser, a alma ou o que Buda chamou de Annata – aquilo que está além de nomes e formas, além do pensamento. E, como resultado, acreditamos que somos esses corpos limitados.
Vivemos no medo, consciente ou inconsciente de que a estrutura limitada do Ser, a qual estamos identificados, irá morrer.
No mundo de hoje, a maioria das pessoas que estão empenhadas em práticas religiosas ou espirituais, como yoga, oração, meditação, cânticos ou qualquer tipo de ritual, estão praticando técnicas que são condicionadas, o que significa que são apenas parte das construções do ego.
Essa busca ou atividade não é um problema… Mas pensar que você encontrou a resposta em alguma forma externa é o problema.
Espiritualidade em sua forma mais comum não é diferente do pensamento patológico que está acontecendo em todos os lugares. É mais uma agitação da mente.
Mais “afazeres humanos” em oposição a “ser humano”.
A construção do ego quer mais dinheiro, mais poder, mais amor, mais de tudo. Igualmente, aqueles que estão no chamado caminho espiritual desejam ser mais espirituais, mais despertos, mais equânimes, mais pacíficos, mais iluminados.
O perigo de você ler este texto é que sua mente poderá querer alcançar o Samadhi. Ou, talvez ainda mais perigoso, é que sua mente pode pensar que já alcançou Samadhi.
Mas sempre que há um desejo de alcançar algo, você pode ter certeza de que é a construção do ego trabalhando.
Samadhi não é sobre alcançar ou acrescentar qualquer coisa para si mesmo.
Realizar Samadhi é aprender a morrer antes de morrer.
Vida e morte são como Yin e Yang: um continuum inseparável. Incessantemente desdobrando, sem começo nem fim. Quando afastamos a morte, também afastamos a vida.
Quando você experimenta diretamente a verdade de quem você é, não há mais medo da vida ou da morte.
Somos informados de quem somos pela nossa família, pela sociedade e nossa cultura e, ao mesmo tempo, somos escravos de profundos desejos biológicos inconscientes e aversões que governam nossas escolhas.
A construção do ego não é mais do que o impulso de repetir…
É simplesmente o caminho que a energia tomou uma vez e a tendência da energia a tomar esse caminho novamente, seja ele positivo ou negativo para o organismo.
Existem infinitos níveis de memória ou mente, espirais dentro de espirais. Quando sua consciência se identifica com essa mente ou construção do ego, ela lhe prende ao condicionamento social, que você pode chamar de matriz.
Há aspectos do ego que podemos estar conscientes, mas é o inconsciente, a fiação arcaica, os medos existenciais primitivos, que estão realmente dirigindo toda a máquina.
Padrões infinitos relacionados a buscar o prazer e evitar a dor são sublimados em comportamentos patológicos… nosso trabalho… nossos relacionamentos… nossas crenças… nossos próprios pensamentos... e todo o nosso modo de viver.
Como gado, a maioria dos seres humanos vive e more em subjugação passiva, alimentando suas vidas para a matriz.
Vivemos vidas trancadas em padrões limitados.
Vidas muitas vezes cheias de grande sofrimento e nunca nos ocorre de podermos realmente tornarmos livres.
É possível abandonar a vida que foi herdada do passado, para viver aquela que está esperando para vir através do mundo interior.
Todos nós nascemos neste mundo com estruturas biológicas condicionadas, mas sem auto-consciência. Muitas vezes, quando olhamos para os olhos de uma criança, não há vestígio do Ser, apenas um vazio luminoso.
A pessoa que se desenvolve é uma máscara usada sobre a consciência.
Shakespeare disse: “O mundo inteiro é um palco, e todos os homens e mulheres não passam de meros atores”.
Em um indivíduo desperto, a consciência brilha através da personalidade, através da máscara. Quando você está desperto, você não se identifica com seu personagem, não acredita que é a máscara que está vestindo. Mas também não desiste de desempenhar um papel.
Quando estamos identificados com o nosso personagem, nossa personalidade, isto é Maya, a ilusão do Ser.
Samadhi é despertar do sonho do personagem no jogo da vida.
Dois mil e quatrocentos anos depois que Platão escreveu A República, a humanidade ainda está saindo da caverna de Platão. Na verdade, podemos estar mais fascinados por iluisões do que nunca antes…
Platão tinha um relato de Sócrates sobre um grupo de pessoas que viviam acorrentadas em uma caverna por todas as suas vidas, defronte a uma parede em branco. Tudo o que podiam ver eram sombras projetadas na parede pelas coisas que passavam diante de um fogo que estava atrás deles. Então, este show de marionetes se torna o mundo conhecido deles.
De acordo com Sócrates, as sombras eram tão próximas que os prisioneiros jamais conseguiriam ver a realidade. Mesmo depois de serem informados sobre um mundo exterior à caverna, eles continuaram a acreditar que as sombras eram tudo o que havia.
Mesmo se eles suspeitassem que poderia mesmo haver algo mais, eles não estavam dispostos a deixar o que era familiar.
A humanidade hoje é como as pessoas que só viram as sombras na parede da caverna. As sombras são análogas aos nossos pensamentos. O mundo do pensamento é o único mundo que conhecemos.
Mas existem outros mundos que estão além dos pensamentos. Além da mente dualista.
Você está disposto a sair da caverna, para deixar tudo o que você tem conhecido e descobrir a verdade de quem você é?
Para experienciar o Samadhi é necessário desviar a atenção das sombras, dos pensamentos em direção à luz.
Quando uma pessoa é acostumada somente à escuridão, então deve gradualmente acostumar-se à luz.
Como aclimatizar a qualquer novo paradigma leva tempo e esforço, e uma vontade de explorar o novo, bem como abandonar o velho.
A mente concreta pode ser comparada a uma armadilha para a consciência, um labirinto ou uma prisão. Não é que você esteja na prisão… você é a prisão.
E a prisão é uma ilusão.
Quando você se identifica com um eu ilusório, então você está dormindo. Uma vez que você está ciente da prisão, se você luta para sair da ilusão, então você está tratando a ilusão como se fosse real e você permanece ainda dormindo, só que agora o sonho se torna um pesadelo. Você estará perseguindo e fugindo de sombras repetidamente.
Samadhi é despertar do sonho do eu separado ou a construção egoica. É despertar da identificação com a prisão que chama de eu.
Você não pode ser realmente livre porque, onde quer que vá, sua prisão está lá.
Despertar não se trata de se livrar da mente ou da matriz. Pelo contrário, quando você não está identificado com a mente, então você pode experimentar a vida mais plenamente, apreciando o show como ela é, sem desejo ou medo.
Nos antigos ensinamentos isso era chamado de Jogo Divino de Leila: o jogo de jogar a dualidade. A consciência humana é um continuum. Em um extremo, os seres humanos estão identificados com o eu inferior, o eu material. No outro extremo está Samadhi, a cessação do eu inferior.
Cada passo que damos no continuum em direção ao Samadhi traz menos sofrimento. Menos sofrimento não significa que a vida está livre da dor. Samadhi está além da dualidade de dor e prazer.
O que significa é que há menos mente, menos eu inferior criando resistência a tudo o que se revela. E essa resistência é o que cria o sofrimento.
Realizar o Samadhi ao menos uma vez permite que você perceba profundamente o que está na outra extremidade do continuum. Verá que há algo além do mundo material e interesse próprio.
Quando há uma cessação real da estrutura do eu inferior em Samadhi, não há pensamento egoico, nenhum “eu”, nenhuma dualidade.
É nesse vazio que está a aurora do Prajna ou da Sabedoria – a compreensão de que o Ser Imanente está além do jogo da dualidade, além de todo o continuum.
O Ser Imanente é atemporal, imutável, sempre agora.
A iluminação é a fusão da espiral primordial, do mundo manifestado ou do lótus em constante mutação, no qual o tempo se desdobra, com o seu Ser atemporal.
Sua fiação interna cresce como uma flor desdobrante enquanto você se desidentifica com o eu inferior, com a mente concreta, tornando-se uma ponte viva entre o mundo do tempo e o mundo atemporal.
Mas, meramente realizar o Ser Imanente é apenas o começo de um caminho. A maioria das pessoas terá que experimentar e perder Samadhi inúmeras vezes em meditação antes que sejam capazes de se integrar em outras facetas da vida.
Não é incomum ter profundas percepções sobre a natureza do seu Ser, seu Eu Superior, durante a meditação ou auto-investigação, apenas para encontrar-se novamente caindo de volta em velhos padrões, esquecendo a verdade de quem você realmente é.
Para realizar essa quietude ou o vazio em cada faceta de si mesmo, é tornar-se o vazio dançando como todas as coisas.
Quietude não é algo separado do movimento. Não é o oposto ao movimento. Em Samadhi, a quietude é reconhecida como sendo idêntica ao movimento, a forma é idêntica ao vazio.
Isto é sem sentido para a mente porque a mente é o surgimento da dualidade.
Rene Descartes, o pai da filosofia ocidental, é famoso pelo provérbio:
“Penso, logo existo”
Nenhuma outra frase resume de forma mais clara a queda da civilização e a total identificação com as sombras na parede da caverna de Sócrates.
O engano de Descartes, como o engano de quase todos os seres humanos, foi igualar o Ser Imanente com os seus limitados pensamentos.
No início de seu tratado mais famoso, Descartes escreveu que quase tudo pode ser posto em dúvida. Pode-se duvidar de seus sentidos e até de seus pensamentos.
Da mesma forma, no Kalama Sutra, o Buda disse que, a fim de apurar a verdade, deve-se duvidar de todas as tradições, escrituras, ensinamentos e todo o conteúdo da mente e dos sentidos.
Ambos começaram com grande ceticismo, mas a diferença foi que Descartes parou de perguntar ao nível do pensamento enquanto o Buda se aprofundava. Ele penetrou além dos níveis mais profundos da mente.
Talvez se Descartes fosse além de sua mente pensante, ele teria percebido que sua verdadeira natureza e consciência ocidental seria muito diferente hoje. Em vez disso, Descartes descreveu a possibilidade de um demônio maligno que poderia estar nos mantendo sob um véu de ilusão. Descartes não reconheceu esse demônio diabólico pelo que era.
Como no filme Matrix, todos nós poderíamos estar ligados a algum programa elaborado, criando um ilusório mundo de sonhos. No filme, os seres humanos viveram suas vidas na matriz, enquanto em outro nível eles eram meramente baterias, alimentando com sua força vital as máquinas que usavam dessa energia para sua própria programação.
As pessoas sempre querem culpar algo fora de si mesmos pelo estado do mundo ou pela sua própria infelicidade. Quer seja uma pessoa, um grupo, um país em particular, uma religião ou de algum tipo de controle Illuminatti, como o demônio diabólico de Descartes, ou as máquinas sencientes no filme Matrix.
Ironicamente, o demônio que Descartes imaginava era exatamente o que ele próprio se definia.
Quando você realiza o Samadhi, fica claro que há um controlador, há uma máquina, um diabo demoniando sua vida dia após dia: Você!
Sua estrutura é composta de muitos pequenos sub-programas condicionados ou pequenos chefes. Um pequeno chefe que anseia por comida, outro anseia por dinheiro, outro por status social, posição, poder, sexo, intimidade, outro quer a consciência ou a atenção dos outros. Os desejos são literalmente sem fim e insaciáveis: jamais podem ser satisfeitos.
Gastamos muito tempo e energia decorando nossas prisões, sucumbindo às pressões para melhorar nossas máscaras e alimentando nossos pequenos chefes, tornando-os mais poderosos.
Como os viciados em drogas, quanto mais tentamos satisfazer os pequenos chefes, o eu inferior, nosso ego, mais acabamos desejando.
O caminho para a liberdade não é o auto-aperfeiçoamento ou, de alguma forma, satisfazer o planejamento do eu inferior, mas é uma queda de qualquer planejamento do eu inferior completamente.
Algumas pessoas temem que despertar sua verdadeira natureza significa que eles perderão sua individualidade e gozo da vida. Na verdade, o oposto é verdadeiro. A única individualização da alma só pode ser expressa quando o eu condicionado é superado.
Porque permanecemos adormecidos na matriz, a maioria de nós nunca descobre o que sua alma, seu Eu Superior realmente quer expressar.
O caminho para Samadhi envolve meditação, que é tanto observar o eu condicionado, inferior, aquele que muda, quanto realizar a sua verdadeira natureza, seu Eu Supeior, o que não muda.
Quando você chegar ao seu ponto inerte, a fonte de seu Ser, então você espera mais instruções, sem qualquer insistência de como o seu mundo exterior tem que mudar. Não o meu desejo, mas que a vontade superior, seja feita.
Se a mente só tenta mudar o mundo exterior para sujeitar-se a alguma ideia do que você acha que o caminho deve ser, é como tentar mudar a sua imagem em um espelho, manipulando o seu reflexo nele.
Para fazer a imagem em um espelho sorrir, você obviamente não pode manipular o seu reflexo no vidro espelhado, você terá que realizar o “você sorrindo” que é a fonte autêntica do reflexo.
Uma vez que você realiza o seu Eu verdadeiro, isto não significa que qualquer coisa no exterior necessariamente precisa mudar.
O que muda é a energia interior, consciente, inteligente que é liberta dos padrões condicionados e torna-se disponível para ser direcionada pela alma.
Você só pode tornar-se consciente do propósito da alma quando você é capaz de observar o seu eu inferior e suas intermináveis perseguições e prisões e deixá-los ir, desapegar-se dele.
Na mitologia grega, foi dito que os deuses condenaram a Sísifo a repetir uma tarefa sem nenhum sentido, por toda a eternidade: empurrar sem parar uma pedra gigantesca montanha acima, só para depois deixar rolar montanha abaixo novamente e recomeçar.
O existencialista francês e autor vencedor do Prêmio Nobel, Albert Camus, viu a situação de Sísifo como uma metáfora para a humanidade. Ele pergunta: “Como podemos encontrar significado nesta existência absurda?”
Como humanos estamos trabalhando sem parar, construindo para um amanhã que nunca chega, e então morremos. Imitamos em vida o mesmo que as formigas, mas diferentemente delas, temos opções que ela não têm.
Se verdadeiramente realizarmos essa verdade, ou nos tornaremos loucos se formos identificados com nossas personalidades egoicas ou despertaremos e nos tornaremos livres.
Nunca poderemos ter sucesso na luta externa, porque é apenas um reflexo do nosso mundo interior. Atuar na consequência não pode mudar a causa.
A piada cósmica, o absurdo da situação torna-se claro quando há um completo e absoluto fracasso do eu inferior para despertar através de suas buscas fúteis.
No Zen Budismo há um ditado:
“Antes da iluminação corte madeira, carregue água.
Depois da iluminação, corte madeira, carregue água”
Antes da iluminação é preciso rolar a pedra morro acima. Após a iluminação, também é preciso rolar a pedra morro acima.
Então, o que mudou?
A resistência interior ao que é. A luta foi abandonada, ou melhor, a pessoa que luta foi percebida como ilusória. E sem resistência, não há sofrimento.
A vontade individual ou a mente individual e a vontade divina, ou mente superior, estão alinhadas.
Samadhi é, em última análise, uma queda de toda a resistência interior a todos os fenômenos mutáveis, sem exceção.
Aquele que é capaz de realizar a paz interior, independente da circunstância, atingiu o verdadeiro Samadhi. Abandonou a resistência não porque aceita uma coisa ou outra, mas para que sua liberdade interior não dependa do exterior.
É importante comentar que quando aceitamos a realidade como ela é, não significa necessariamente que paramos de agir no mundo ou que nos tornamos meditadores, pacifistas, ou especiais ou separados. Na verdade, o oposto pode ser verdade. Quando somos livres para agir sem sermos movidos por motivos inconscientes, então é possível agir em alinhamento com o Tao, com toda a força de nossa energia interior atrás de nós.
Muitos vão argumentar que, a fim de mudar o mundo e trazer a paz, precisamos lutar mais duramente contra os nossos inimigos percebidos.
Lutar pela paz é como gritar pelo silêncio.
Apenas cria mais do que você não quer.
Hoje há guerras contra tudo: a guerra contra o terrorismo, guerra contra doenças, guerras contra a fome… todas as guerras são na verdade uma guerra contra nós mesmos. A luta da guerra é parte de um delírio coletivo. Dizemos que queremos a paz, mas continuamos a eleger líderes que se engajam nas guerras. Mentimos a nós mesmos dizendo que defendemos os direitos humanos, mas continuamos a comprar produtos feitos em fábricas escravizantes. Dizemos que queremos ar puro, mas continuamos a poluir. Queremos que a ciência nos cure do câncer, mas não mudamos nossos comportamentos habituais autodestrutivos que nos tornam mais suscetíveis a adoecer. Nos iludimos que estamos promovendo uma vida melhor. Não queremos ver nossas partes ocultas que estão tolerando o sofrimento e a morte.
A crença de que podemos ganhar uma guerra contra o câncer, a fome, o terror ou qualquer inimigo que foi criado por nosso próprio pensamento e comportamento, na verdade nos permite continuar iludidos que não temos de mudar a forma como agimos neste planeta.
O mundo interior é onde a revolução deve primeiro acontecer.
Somente quando pudermos sentir diretamente a espiral da vida interior, o mundo exterior entrará em alinhamento com o Tao.
Até lá, qualquer coisa que façamos contribuirá para o caos já criado pela mente. Guerra e paz surgem juntas em uma dança sem fim. Elas são um continuum. Uma metade não pode existir sem a outra. Assim como a luz não pode existir sem escuridão e o acima não pode existir sem o abaixo.
O mundo parece querer luz sem escuridão, plenitude sem vazio, felicidade sem tristeza.
Quanto mais a mente se envolve, mais fragmentado o mundo se torna. Cada solução da mente egoica é impulsionada pela ideia de que há um problema e, muitas vezes, a solução se torna um problema ainda maior do que o que se estava tentando resolver.
Aquilo que você resiste, persiste.
A criatividade humana, através da ciência, cria novos antibióticos e descobrem que a natureza fica mais “esperta” à medida que as bactérias se fortalecem.
Apesar dos nossos melhores esforços na luta atual, a prevalência do câncer está aumentando, assim como o número de pessoas famintas no mundo cresce constantemente, bem como o de ataques terroristas que continuam a aumentar.
Então, o que há de errado em nossa abordagem?
Como o Aprendiz de Feiticeiro do poema de Goethe, temos conquistado um grande poder, mas não temos a sabedoria para usá-lo.
O problema é que não entendemos as ferramentas que estamos usando. Não entendemos a mente humana, seu papel e seu propósito. A crise nasce do modo condicionado e limitado com que pensamos, a maneira que nós sentimos e experimentamos a vida.
Nosso racionalismo nos roubou nossa capacidade de reconhecer e experimentar a sabedoria de muitas culturas antigas. O pensamento egoico nos roubou a capacidade de sentir a imensa e profunda sacralidade da vida, a luminosidade da vida, e de realizar inteiramente diferentes níveis de consciência, que agora parecem estar quase perdidos para a humanidade.
Na antiga tradição egípcia, Neters eram formas arquetípicas cujas características podiam ser encarnadas por aqueles que purificavam seus corpos físico e espiritual de tal forma que eles estariam aptos a abrigar consciências superiores.
O Neter original, ou o princípio divino desta sabedoria era conhecido como Thoth ou Tot ou Tehuti, representado frequentemente como um escriba com a cabeça de um pássaro ou de um Ìbis, que representava a origem de todo o conhecimento e sabedoria.
Thoth poderia ser descrito como o princípio cósmico do pensar ou do pensamento. Thoth nos deu a linguagem, conceitos, escrita, matemática e todas as artes e manifestações da mente. Somente aqueles que haviam passado por um treinamento especial eram autorizados a acessar o conhecimento sagrado de Thoth.
O Livro de Thoth não é um livro físico, mas é a sabedoria do reino akáshico ou dos reinos espirituais superiores. A lenda conta que o conhecimento de Thoth estava profundamente escondido em um lugar secreto, dentro de cada ser humano, e estava protegido por uma serpente dourada.
O mito arquetípico da serpente ou dragão que guarda um tesouro é aquele que permeia muitas culturas e tem sido chamado por nomes como Kundalini Shakti, Chi, Espírito Santo e Energia Interior.
A serpente dourada é a construção egoica que está ligada nas energias interiores e até que ela esteja dominada e superada, a alma nunca será capaz de alcançar a verdadeira sabedoria.
Dizia-se que o Livro de Thoth trouxe nada além de sofrimento a qualquer indivíduo que o tenha lido, mesmo que eles encontrassem os segredos dos próprios deuses e tudo que está escondido nas estrelas. O que deve ser entendido é que o livro trouxe sofrimento a qualquer indivíduo que leu, qualquer ego que tentou controlá-lo.
Na tradição milenar egípcia, a consciência desperta foi representada por Osíris.
Sem essa consciência desperta, qualquer conhecimento ou entendimento obtido pelo eu inferior limitado seria perigoso, desconectado da sabedoria superior, do Eu Superior.
O Olho de Hórus tinha que estar aberto.
O significado esotérico que encontramos aqui é semelhante à história mais conhecida da “queda” do Jardim do Éden. O livro de Thoth é paralelo ao livro do conhecimento do bem e do mal, cujo fruto Adão e Eva foram tentados a comer.
A humanidade, é claro, já comeu o fruto proibido, já abriu o Livro de Thoth e já foi lançada para fora do jardim.
A serpente ou o dragão é uma metáfora para a espiral primordial que se estende do microcosmo ao macrocosmo. Hoje a serpente está vivendo como você. É a mente egoica expressa como o mundo manifestado.
Nós nunca tivemos acesso a tanto conhecimento. Temos penetrado profundamente no mundo material, até encontrando a assim chamada Partícula de Deus – o Bóson de Higgs. Mas nunca fomos mais limitados, mais ignorantes de quem somos, de como viver, bem como não entendemos o mecanismo pelo qual criamos tanto sofrimento.
Nosso pensamento criou o mundo como ele é agora.
Sempre que rotulamos algo como bom ou mau, ou criamos preferência em nossa mente, é devido ao surgimento de estruturas egoicas ou interesses pessoais. A solução não é lutar pela paz ou conquistar a natureza, mas simplesmente reconhecer a verdade de que é a própria existência do ego que cria a dualidade, uma divisão entre o eu e o outro, o meu e o seu, o homem e a natureza, interior e exterior.
O ego é violência. Requer uma barreira, uma divisão do outro a fim de existir. Sem o ego não há guerra contra nada. Não há arrogância, não há natureza excessiva para tirar proveito.
Essas crises externas em nosso mundo refletem uma grave crise interna.
Não sabemos quem somos.
Estamos completamente identificados com nossas identidades egoicas, consumidos pelos medos e separados de nossa verdadeira natureza.
As raças, religiões, países, partidos políticos, qualquer grupo a que pertencemos reforçam todas as nossas identidades egoicas. Quase todos os grupos que existem no planeta hoje querem reivindicar sua perspectiva como verdadeira e correta, como fazemos em um nível individual.
Ao afirmar a verdade como sua, o grupo perpetua sua própria existência, da mesma forma que um indivíduo ou ego se define contra os outros.
Agora, mais do que nunca, diferentes realidades e sistemas de crenças polarizados estão coexistindo na Terra. É possível que pessoas diferentes experimentem pensamentos e reações emocionais completamente diferentes aos mesmos fenômenos externos.
Da mesma forma, Samsara e Nirvana, céu e inferno são duas dimensões diferentes que ocupam o mesmo mundo. Um evento que pode parecer apocalíptico para uma pessoa, pode ser visto como uma benção para outro.
Então, o que está se tornando óbvio é que suas circunstâncias externas não precisam afetar seu mundo interior de nenhuma maneira em particular.
Realizar o Samadhi é tornar-se uma roda autopropulsada, tornar-se autônomo, um Universo para si mesmo. Sua experiência de vida não depende de mudanças de fenômenos.
Uma analogia pode ser feita com o Cubo de Metatron. Metatron é mencionado em vários textos cristãos, islâmicos e judaicos, e é arquetipicamente relacionado com o egípcio Neter Thoth, bem como com Hermes Trimegisto da Grécia. Metatron está intimamente ligado ao tetragrama.
O tetragrama é o padrão geométrico fundamental, o modelo ou emanação primordial da realidade física, que tem sido chamado de Palavra de Deus ou Logos.
Ao se ver uma representação bidimensional da figura, se você olhar de uma certa maneira, poderá perceber um cubo 3D. Quando você vê o cubo, nada muda na figura, mas sua mente adicionou uma nova dimensão à sua visão. Dimensionalidade ou a perspectiva de alguém é simplesmente uma questão de habituar-se a uma nova maneira de perceber o mundo.
Ao realizar o Samadhi, nos tornamos livres de perspectivas ou livres para criarmos novas perspectivas, porque não há um eu inferior, um ego envolvido ou ligado a um determinado ponto de vista.
As maiores mentes da história humana frequentemente apontam para níveis de pensamento além da estrutura limitada do eu inferior.
Einstein disse:
“A verdadeira escala de um ser humano é determinada, principalmente,
pelo grau e senso em que ele alcançou a libertação do eu.”
Portanto, não é que o pensamento e a existência do eu sejam ruins, o pensamento é uma ferramenta maravilhosa quando a mente está a serviço do coração.
No Vedanta, diz-se:
“A mente cria um bom servo, mas um pobre mestre.”
O ego perpetuamente filtra a realidade através da linguagem e dos rótulos, e está constantemente julgando, preferindo uma coisa sobre a outra. Quando a mente e os sentidos são seu mestre, eles criarão sofrimento infinito, desejo e antipatias sem fim, nos trancando na matriz do pensamento.
Se você quiser realizar o Samadhi, não julgue seus pensamentos como bons ou maus, mas descubra quem você é antes do pensamento, antes dos sentidos, das crenças, dos outros, do exterior. Quando todos os rótulos são descartados, então é possível ver as coisas como elas são.
No momento em que uma criança ouve o que é um pássaro, se elas acreditarem no que ouviram, elas nunca mais verão um pássaro. Elas passam a ver seus pensamentos sobre os pássaros.
A maioria das pessoas pensam que são livres, conscientes e despertas. Mas, se acreditam que já estão despertas, então por quê fazem um esforço árduo para alcançar aquilo que já têm?
Antes que seja possível despertar, é necessário aceitar que você está adormecido, vivendo na matriz. Examine sua vida cuidadosamente, sem mentir para si mesmo.
Você é capaz de parar seus padrões de vida robóticos, repetitivos, se quiser?
Você é capaz de parar de buscar o prazer e evitar a dor?
Você é viciado em certos alimentos, atividades, passatempos?
Você está constantemente julgando, culpando, criticando a si mesmo e aos outros?
Sua mente procura incessantemente estímulo ou você é completamente realizado apenas estando em silêncio?
Você se importa sobre o que as pessoas pensam sobre você?
Está buscando aprovação, reafirmações positivas?
Você de alguma forma sabota situações em sua vida?
A maioria das pessoas experimentará suas vidas da mesma maneira hoje como será amanhã… e daqui a um ano… e daqui a dez anos.
Quando você começa a observar sua natureza robotizada, você se torna mais desperto. Começa a perceber a profundidade do problema. Começa a se ver completa e absolutamente adormecido, perdido em uma ilusão.
Como os habitantes da caverna de Platão, muitos que ouvem esta verdade não estarão dispostos ou capazes de mudar suas vidas porque estão apegados a seus padrões familiares. E nós vamos muito longe explicando e justificando nossos padrões, enterrando nossas cabeças na terra em vez de encarar a verdade.
Queremos ser como nossos salvadores, mas não estamos dispostos a subir a cruz nós mesmos.
O que você está disposto a pagar para ser livre?
Perceba que se você mudar seu mundo interior, você deve estar preparado para mudar a vida exterior.
Sua antiga estrutura e sua antiga identidade devem se tornar o solo morto do qual o novo crescimento surge.
O primeiro passo para o despertar é perceber que estamos identificados com a matriz da mente humana, com os condicionamentos e crenças, com a persona, com a máscara.
Algo dentro de nós deve ouvir esta verdade e ser despertado desse sono.
Há uma parte de você, algo intemporal, que sempre conheceu a verdade.
A matriz da mente nos distrai, nos entretém, nos mantém eternamente fazendo, consumindo, agarrando em um ciclo de desejo e aversão com formas em constante mudança, nos impedindo de florescer em nossa consciência, de nosso direito de renascimento evolutivo que é Samadhi.
Pensamento patológico é o que ocorre na vida normal.
Sua essência divina tornou-se escravizada, identifica com a estrutura limitada do eu inferior.
A grande sabedoria, a verdade de quem você é está enterrada profundamente em seu ser.
J. Krishnamurti disse:
“Não é sianl de saúde estar bem adaptado a
uma sociedade profundamente doente.”

Identificação com a mente egoica é a doença e Samadhi é a cura.
Os santos, sábios e seres despertos ao longo da história, aprenderam a sabedoria da auto-entrega.
Como é possível realizar o verdadeiro Ser?
Quando você olhar através do véu de Maya e abandonar o eu ilusório inferior, o que resta?

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