quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

O Reino dos Deuses - Parte 1

Que Templo esplendoroso aquele! Jamais, nem nos meus sonhos mais fantásticos, poderia imaginar nada semelhante. Uma gigantesca Pirâmide de Cristal, cintilante em tons de branco, prata e azul claro indescritíveis aos olhos humanos.

Paralisado diante enormes portais também de cristal, estasiado, ausente de meus sentidos humanos, escuto mentalmente a voz suave e calma do Mestre, que até ali me encaminhou com mãos invisíveis:

- Observa e compartilha!

E, simetricamente, duas portas abriram-se diante de mim. E novamente a mansidão do Mestre em forma de voz:

- Entra! Entrem todos os simples e de amor no coração. Todos os cansados das buscas. Observa e compartilha! Aprende!

Embalado por uma brisa de perfume enebriante que como me despia e harmonizava, sentia meu coração batendo em uma frequência a mim desconhecida, de felicidade serena, embalado por acordes de vento que me penetravam a alma. Adentrava no Templo como que flutuando, guiado pelas atraentes vibrações de seu interior e só então me apercebi que deixara para trás, no imenso portal, minhas vestes carnais.

Vi entristecido ali parado no portal, meu corpo disforme pelas paixões, egoísmo, vaidade, ignorância... e todos os atributos inerentes à minha personalidade separatista. Era um veículo pesado, arrastado por pesadas passadas. Ficou claro... dali ele não poderia passar, embora as portas se mantivessem abertas... Pobre e desgastado corpo de matéria densa, que inconsciente vagava pesadamente perdido, alheio a tudo que se disponibilizava além das monumentais portas de cristal abertas do grande Templo.

Não pude deixar de sentir repulsa diante desse quadro. Então aquele sou eu? Quanta piedade senti. Fiquei tentado a voltar para aquela massa sofredora, infeliz e disforme para ampará-la. Mas, nessa hora, lendo meus pensamentos, interveio o Mestre:

- Você não é aquele corpo. Você é livre e ilimitado como se sente agora. És a causa, aquele o efeito. Aquele nasce, cresce e morre. Você, imortal. Repara como venceste o tempo e o espaço. Repara na tua própria essência divina. Estás em contato com o Deus que há em ti. Vem ser Um conosco.

Num doce impulso de uma brisa, voltei-me novamente para o interior do Templo.

O maravilhoso lugar não tinha paredes e nem teto. Não era o enorme salão que imaginara na entrada. Embora possuisse gigantescas colunas com enormes portais, no mais constituía-se de um cenário da natureza, um recanto da Criação. Contemplei suaves montanhas e vales verdejantes e floridos, entrecortados por riachos preguiçosos. O céu, de um magnífico azul, parecia cutucado ao longe por picos de montanhas que se esticavam tentando alcançá-lo.

Embora o Sol brilhasse já alto, seus raios eram amenos e aqueciam sem agredir, como uma carícia vinda do céu, o que tornava o ar de um frescor rejuvenecedor. Havia um brilho no ar, entrecortado pelos raios de Sol. Sentia-se o respiro da natureza em equilíbrio com o respiro de todas as coisas ali presentes, inclusive eu.

Cascatas de vaporosas espumas etéreas despejam sobre rios de águas cristalinas, que enfrentavam pedras esverdeadas em seu caminho errático. Riachos e córregos juntavam-se a eles em contribuição. Lagos mansos refletiam a luminosidade do Sol e do Céu e na superfície viam-se peixinhos a brincar de cutucar o ar.


E as águas, em perfeita sintonia sonora, cantavam: 


- Nós trabalhamos para a Terra e o nosso trabalho é Amor!


Florestas imponentes de árvores seculares, proporcionavam frescor com suas sombras onde uma vida palpitante pululava: arbustos diversos, alguns desafiando as alturas e outros pequenos, vestiam-se de muitos matizes de verde brilhante, enfeitando a terra. Pequenas flores coloridas brotavam da terra, enquanto outras pendiam em cachos suspensos, formando maravilhosas grinaldas. Algumas folhas verdes grandes e médias compunham o cenário próximo aos troncos das gigantescas árvores. A vegetação rasteira complementava o quadro de majestosa exuberância. E todas juntas, do grave tom das sequóias ao afinadíssimo acorde da vegetação rasteiras, emitiam um só som em coro.


E o Reino Vegetal uníssono cantava assim:


- Nós trabalhamos para o Reino Animal e o nosso trabalho é Amor!


Surpreso, ainda embalado pelo canto admirável, comecei a reparar na enorme quantidade de pássaros, abelhas, insetos voadores diversos e formigas em tráfego incessante. Além dessa visão comum, espíritos da natureza, alguns na terra outros no ar. E todos também cantavam em sintonia perfeita. Canários, rouxinóis, beija-flores e uma infindável variedade de espécies enchiam o ambiente de raros sons, que, certamente, meus ouvidos humanos jamais poderiam perceber. Mães passarinhos alimentavam suas ninhadas e os pais ensinavam o primeiro vôo. O João-de-barro, incansável, parecia entretido na construção de sua casa ainda solteiro. Passarinhos jovens farreavam, os demais trabalhavam, uns de linhagem nobre, com certeza, outros um tanto comum. Mas todos acompanhavam a floresta revigorante com suas vozes solando:


- Nós trabalhamos para a Mãe Natureza e o nosso trabalho é Amor!


Concentradas abelhs chamaram-me a atenção com seu zumbido melodioso, produzindo o doce mel, sorridentes em suas pequenas almas. Vi pequenas formigas trabalhando a terra, dividindo seu ambiente de trabalho com obreiras minhocas, que energizavam o sub-solo, revolvendo a mãe-terra. E as lagartas, escaravelhos, vespas... um sem fim de vida miúda que ecoava conjuntamente uma canças divina:


- Nós trabalhamos para o homem e o nosso trabalho é Amor!


Vi Espíritos da Natureza a trabalhar! Belas sílfides esvoaçando por toda parte, ondinas brincando nas águas doces, gnomos seriamente manipulando a terra, salamandras crepitando o fogo, próximas a um vulcão ora inativo, vestidas de suas labaredas... e haviam duendes, homúnculos, iaras, nereidas, kalungas, trolls, espíritos das águas, sereias, silfos, e tantos outros reunidos num canto fantástico, de sons puríssimos e melodia envolvente. Esses cantos pareciam fazer a vibrar a natureza ao seu redor, provocando a participação nessa música divina das ondas do mar, do sopro dos ventos, do murmurar das folhas agitadas e do som da brisa fresca de um final de tarde.


Sim, os Espíritos da Natureza trabalham cantando... cantando e construindo, construindo e organizando e organizando e criando. Alguns moldavam pelas formas e tons para as flores, outros na dos peixes, outros organizando as nuvens e ventos, outros cuidando de imensas árvores, ou montanhas ou cristais, outros avivando a seiva da terra. Que sons maravilhosos em oitavas perfeitas.


Foi então que pude ver um Ser Magnífico, resplandescente como o Sol, parecia feito de pura Luz que não se continha e emanava de seu corpo em jorros que envolviam os Espíritos da Natureza ao meu redor. Era o Mâhâdeva, o Rei dos Devas, que me observando com um sorriso iluminado, concentrou a voz de todos os Devas que trabalhavam cantando e disse:


- Nós, filho meu, trabalhamos para todos os seres vivos e o nosso trabalho é Amor!






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